terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Perfis


Já falei inúmeras vezes aqui sobre as facetas que mostramos nas diversas situações ou grupos onde convivemos. De acordo com o ambiente ou com quem nos ouve, mostramos esta ou aquela parte de nosso ser, tão complexa a combinação que a nós mesmos acaba nos confundindo. Até chegarmos num ponto onde encontrar o nosso verdadeiro eu torna-se premente, necessário. Torna-se insuportável viver assim, tão perdido de si mesmo.

Esses são os papéis escolhidos por nós. Equivocados ou não.

Me ocorreu no outro dia, entretanto, que para algumas pessoas o que a gente deseja é que elas simplesmente nos vejam como a gente é. Sem máscaras ou fortalezas erguidas, a gente se mostra. Verdade nua e crua, inocência pura de criança. Que elas nos vejam de verdade, para que nos entendendo, possam nos nutrir com sentimento ou com o apoio que a gente precisa ou merece. E espantosamente a gente percebe um dia que se elas nos enxergam, não é de forma alguma como a gente é mas como elas gostariam que a gente fosse. Alterada está não somente a imagem como amaldiçoada a chance de compreensão. E pior ainda é que não enxergando como a gente é, às vezes disseminam a imagem do que a gente é, misturado com o que a gente não é, e o que chega de volta na gente é um reflexo turvo, que por sua vez nada tem a ver com o que a gente queria para a gente, de verdade. E nesse ir e vir de imagens, de perfis traçados ou imaginados, no meio desse caos, a gente tenta, ao contrário de todas as vezes em que a gente finge ser quem não é, provar que o nosso verdadeiro eu nada tem a ver com o eu imaginado pelo outro. Tentativas em vão. Porque o que o outro quer, na verdade, é continuar com essa imagem sonhada. E nos atira de volta a revolta, a mágoa, por nossa incapacidade de corresponder, até que a gente em troca, cansa de ser quem a gente é, levantando, desgraçadamente, uma máscara difícil de carregar. Máscara que invariavelmente termina por nos explodir no rosto.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Le Petit Nicolas

Reaprendi recentemente que recortes e colagens fazem parte de mim desde muito tempo, desde épocas em que eu nem me lembrava mais. Sempre me encantaram, particularmente os trabalhos com dimensão. Quando pequena eu ficava admirando por vários minutos as páginas das estórias de Chapeuzinho Vermelho e Cinderela em versão dimensional, onde mini-cenários exibiam bonequinhas vestidas com pérolas e rendas. Eu examinava cada detalhe e desejava intimamente poder entrar naqueles cenários.

Eu assisti recentemente o filme "Le Petit Nicolas". O filme foi feliz em retratar o livro da forma como o lemos, ou pelo menos da forma como eu o imaginava quando o li há muitos anos atrás. E engraçado isso, o que me marcou mais no filme foi a abertura, com ilustrações originais em forma de pop-up. Genial. Isso me faria sonhar quando era criança, ou melhor, me faz sonhar mesmo depois de adulta!

domingo, 2 de janeiro de 2011

Balanço

"Antes de ter sido sequestrada, eu acho que a felicidade estava relacionada ao sucesso. Atualmente a felicidade está relacionada para mim ao descanso, paz, serenidade".

Um dia desses caiu em minhas mãos uma revista contendo uma entrevista com Ingrid Betancourt, ex-senadora colombiana sequestrada pelas FARC e mantida em cativeiro durante 6 anos. Não posso dizer que acompanhei de tão perto a trajetória de Ingrid mas a sua história me chamou a atenção desde a ocasião do seu sequestro. O documentário que eu assisti a retratou como uma mulher de garra, que lutava contra a pobreza e a corrupção no governo colombiano. Se era verdade ou não, se a postura dela após a sua libertação em 2008 foi correta, nada disso cabe a mim julgar ou defender. O que me interessa nesse caso é a conclusão a que ela chegou após anos de reclusão e ao momento de vida em que ela se encontra.

Estamos iniciando um novo ano. Momento de inevitável reavaliação, de planejamento. Muitos dizem que estamos no início de uma nova era, mudança que se concretizará com alterações drásticas na forma como a vida é vista e valorizada no planeta. Dizem que tudo isso se concretizará em 2012, que as mudanças embora radicais e sofridas, não resultarão no fim do mundo como previa Nostradamus mas como um fim do que há de ruim e início de nova era. Bom, me parece que todo ano existem previsões deste tipo ou de todos os tipos. Eu gostaria muito que dessa vez fosse verdade.

Eu assisti muitos filmes nesse final de semana. Duas temporadas de Dexter, um serial killer que por incrível que pareça a gente aprende a amar, "Whatever Works" de Woody Allen e Casamento Silencioso, um filme de produção romena. E estou iniciando o "Petit Nicolas", livro que eu li há muitos anos atrás e que agora estou tendo o prazer de assistir, com todas as suas deliciosas interpretações infantis do mundo adulto. Ah! E antes que vocês perguntem, se é que vocês se recordam de um post meu antigo, sim, eu consegui reconhecer várias palavras em romeno.

Eu fiquei pensando após essa overdose de informação que há um momento na vida em que a gente tende a olhar para trás, avaliar o que a gente fez de bom ou de ruim e em que a gente sente necessidade de mudar. Quase sempre isso resulta em mudanças radicais. E se a gente não resolve por livre e espontânea vontade promover essas mudanças, parece que de alguma forma a vida se encarrega de forçá-las. Acho que não é nada assim de espetacular, parece ser parte da vida, como um roteiro pré-definido. Sabe aquela história de que os bebês parecem se comportar mais ou menos igual, têm um tempo de chorar, um tempo para sentar, um tempo para engatinhar, e por aí, uma cronologia mais ou menos parecida? Aí vem a adolescência em que por mais popular que se possa parecer, quase sempre lutamos contra nossas próprias inseguranças e dúvidas? Pois é, então existe um período pós-realização ou não realização, por volta dos 40 anos em que a gente resolve jogar tudo para o alto. Não necessariamente porque foi inútil, talvez simplesmente porque foi o certo durante um tempo mas deixou de ser. Ou porque a gente viu que tentar ser o que os outros querem que a gente seja e não o que a gente realmente é, não funciona. Isso me lembra que eu assisti também um documentário sobre Freud. E essa batalha foi o que ele tão brilhantemente descreveu como a luta entre o nosso Superego e o nosso Id.

Estou lendo um livro do Nick Hornby onde várias pessoas tentam suicídio no mesmo local e não só elas não se suicidam como começam uma jornada de conhecimento dos problemas uns dos outros. Eu ainda estou no início do livro. Mas o que me chamou a atenção nesse caso não foram os problemas em si mas o "awakening", o cair da ficha. O "Whatever Works", "Tudo pode dar certo", pinta de uma forma muito divertida essas oportunidades de um "fresh start" como o americano costuma dizer e termo que eu particularmente gosto pois me parece muito simpático ser refrescada com a oportunidade de um novo início. Woody Allen parece ter retomado neste filme seu velho e querido estilo de história passada em NY regada a intelectuais com seus problemas aparentemente sofisticados e complexos mas que na verdade não têm nada de particulares, são apenas de natureza humana. Filme regado a diálogos inteligentes, belas prateleiras de livros que eu tanto gosto e o principal: o sarcasmo brilhantemente bem-humorado.

Bom, parece que o meu balanço não resultou em muita conclusão. Sigo aqui pensando em todas essas coisas, refletindo sobre a vida, nas verdades que um dia a gente questiona, chega a pensar que não eram verdades como a gente imaginava. Sonhando com um novo mundo, desejando que um dia deixemos de ser prisioneiros, seja de um sistema político, uma relação equivocada, uma expectativa ou mesmo de nossos próprios pensamentos. Desejando estudar cada vez mais, melhorar não somente intelectualmente mas como ser completo e único e ao mesmo tempo interconectado. Esses são os meus desejos para o ano que se inicia e para os que estão por vir. E é o que desejo a todos vocês. Um feliz 2011!!