sexta-feira, 30 de abril de 2010

Vida simples

Estava olhando o site que eu mencionei no post passado, da revista "Vida simples" e me perdi neste paradoxo. Fiquei tentando compreender porque é complexo viver de forma simples. Se é simples, não deveria ser simples?


Fazer o bem

A revista Vida Simples do mês passado abordou o tema que não sei se seria exatamente: "Você é do bem?". Era algo do tipo. Mas o que importa é que foram discutidos vários aspectos sobre fazer o bem principalmente no contexto social (caridade, etc).

Um ponto que me interessou muito foi quando a reportagem dizia que para fazer o bem, é necessário respeitar a vontade do objeto da benfeitoria. Me lembrou a "caída de ficha" da Sandra Bullock no excelente "Um sonho possível".

Mas certamente isto não me chamou a atenção por causa da correlação com o filme. A identificação sem sombra de dúvida surgiu pelo fato de que eu já me vi vítima de supostas ajudas não requisitadas e que incomodaram, nas quais se seguiram aquele debate, de um lado a pessoa incomodada e do outro a outra magoada porque "só queria ajudar". Ou agradar. Tanto faz.

Aí chega o dia, ou os dias, em que a gente passa de "beneficiado incomodado" a "benfeitor magoado". "Puxa, ela não pediu mas eu sei que ela gosta e fiz para agradar!"

Como é difícil o limite, não? Saber até onde a gente faz realmente para agradar a outra pessoa ou se é para agradar a si próprio, inconscientemente desejando algum tipo de reconhecimento, alimento para a carência íntima.

De um lado, o entusiasmo exacerbado. Do outro, o desânimo, o medo de desagradar. Não deixo, como sempre, de dizer que a solução é o equilíbrio. Mas como atingi-lo? Até onde as ações caracterizam companheirismo, cuidado, relação sadia ou dependência emocional?

Inspiração lilás



Mais um presentinho.



terça-feira, 27 de abril de 2010

Sobre ser no passado e no presente: em mutação

Estava lendo a última edição da revista Galileu, em especial a reportagem que fala sobre o "Lado bom da depressão". O link adicionado não demonstra a reportagem na íntegra mas eu me lembro de um depoimento em que o rapaz diz que a depressão o levou a se conhecer melhor e a se perdoar mais.

Não tenho conhecimento suficiente para afirmar se a depressão pode ter um lado bom, ou se a depressão de verdade sempre exige ajuda médica e aquela em que a pessoa consegue de alguma forma contornar não poderia ser caracterizada como depressão propriamente dita mas sim, como uma tristeza profunda, paralisante. De qualquer forma, eu acredito sim, que o sofrimento profundo possa ser um detonador de mudanças e em muitas vezes boa.

Estava pensando sobre mudanças, auto-conhecimento, o verdadeiro "eu", bullying, adolescência, todas essas coisas ao mesmo tempo. Na verdade, acho que é muito difícil separar o que a gente é, do que a gente quer ser e do que esperam que a gente seja. Há momentos em que tudo isso se mistura e o que os outros esperam que a gente seja, se torna demasiadamente forte e prolongado. O que é pior até do que tentar ser o que a gente não é. Tentando ser o que a gente não é, a gente no fundo está tentando satisfazer um desejo íntimo. Tentar ser o que os outros querem não tem nada de íntimo, embora sirva como aprendizado.

Então fiquei aqui refletindo sobre isso tudo e meu deu um calorzinho por dentro. Um reconhecimento de que por mais difíceis que sejam as transições e as mudanças, que existe algo muito enternecedor em olhar para nós mesmos agora, comparar com o passado presente e com o passado distante e ter aquela sensação de: "ei, eu estou te reconhecendo novamente. Estes são os seus sonhos, mesmo que relidos". Algo reconfortante em perceber que felizmente, chega uma hora na vida de alguns em que a gente não precisa sequer tentar ser quem a gente não é, quem dirá ser alguém que os outros querem que a gente seja. E o mais surpreendente: perceber que não só existem pessoas que são como a gente é, como são com que a gente gosta de estar e o mais importante: que gostam de como a gente é.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Saudades de Ofélia


Longas, numerosas e abafadas manhãs de intermináveis férias no Rio de Janeiro.

Infância de apartamento.

Clique, clique, Thor, Tom e Jerry, Pica-pau. Nada de novo.

No meio da programação, uma novidade: programa de culinária.

Olhos curiosos que observam as mãos mágicas, a calma, o detalhe.

"Hum, isso aqui vai ficar gostoso!"

"Parece tão fácil!"

Um pouco de farinha aqui, quebre os ovos, misture bem.

A manteiga: e quanta manteiga!

Voz pausada, tranquila, um certo sotaque.

Olhos atentos, mente ativa que tudo observa, inconscientemente gravando. Cada detalhe.

A apresentadora anuncia: "isto aqui vai ficar uma delícia". E a imaginação acredita.

Dezenas de pratos saboreados, todos na imaginação.

Infância superada, aventuras na cozinha adolescente. Fase adulta: "odeio cozinhar"!

Trabalho, trabalho, trabalho... a luta contra o tempo. Que chato cozinhar!

Eu não quero cozinhar, eu não quero cozinhar, eu não quero cozinhar.

Pausa para reflexão: valores primordiais, sentido da vida?

Arte, comida, descanso. O ócio essencial? E os sonhos de infância?

E os bolinhos enrolados? E os pastéis fechados? E a massa de bolo crua?

C-O-N-S-T-A-T-A-Ç-Ã-O: cozinhar não é tão ruim assim.

Entre saladas, bolos e grelhados, temperos e azeites: puxa, como é bom cozinhar! Um dos prazeres da vida.

C-O-N-S-T-A-T-A-Ç-Ã-O-2: cozinha não precisa ser atribulada, tumultuada ou vaporosa. Cozinha pode ser devagarzinho, ao seu tempo, como aquela da infância, da saudosa D.Ofélia.

Ô cozinha maravilhosa da D.Ofélia! Obrigada, senhora: infância recuperada! Tomadas as rédeas da vida!

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Então ele ganhou um jardim


Sentado no escuro, sem nada ver, sentindo uma leve opressão no peito. Foi quando ele se deu conta de que lá no fundo ouvia um chilrear insistente. Começou a prestar mais atenção e o que de início lhe soava um tanto irritante, mudou. O som começou a preencher agradavelmente seu ouvido, dando-lhe uma sensação de estar num jardim.

Pouco a pouco começou a visualizar o jardim. Um morno e ensolarado jardim. De canteiros floridos, bem cuidados, canteiros de vários formatos que juntos formavam um bonito desenho, se fosse possível vê-lo de cima. Havia no fundo uma grande construção muito branca. Suas portas eram adornadas por pedras esculpidas. O frio que sentia por dentro aos poucos foi se desmanchando.

"Por que eu nunca passeei nesse jardim?"
"Por que você não o enxergava".

Isto era verdade. Deu-se conta que antes, nem sequer enxergava. Havia algo que lhe tapava a visão. Nem sabia direito o que era.

"Vá, ande pelo jardim, ele é seu".

Olhou à sua volta. Caminhos bem delineados, cobertos de redondas pedrinhas, entre bege e marrom. Realmente dava vontade de andar por ali, sentindo o calor do sol no rosto.

"Eu posso mesmo andar nesse jardim?"
"Sim, você pode. Assim como os outros também podem. Você vê lá longe, atrás daqueles arbustos? Consegue enxergá-los escondidos?"
"Sim, eu os vejo. Por que eles não entram aqui?"
"Eles estão perdidos, têm medo. Não sabem que têm permissão de entrar. Eles não entram porque pensam que não são merecedores".
"Eu também não me sentia merecedor?"
"Não, mas agora você já sabe que é e pode ficar aqui".

Pensou em tomar uma direção, mudou de idéia.

"Posso ir por aqui?"
"Você pode ir por onde achar melhor. Você está no caminho certo. Todos os caminhos deste jardim terminam no mesmo lugar. Você pode explorar um de cada vez. Há muito o que ver".

Sentiu uma alegria inexplicável. Sentiu-se acolhido, reconfortado. Firme.
"Sim, estou seguro".