sábado, 30 de maio de 2009

Tribos

Eu voltei a andar de metrô. Minha experiência com o metrô me traz sensações tão diversas que poderia escrever posts e posts sem fim. Metrô e caminhada. Caminhada também me faz pensar. Sempre.

Tenho "freqüentado" a estação Conceição do metrô. Estação antes desconhecida para mim. Chego sempre apressada, sempre atrasada. Ontem, ao contrário do normal, voltei para casa sem hora, sem preocupação. E voltei por uma entrada diferente do metrô. Por um lado bastante movimentado, escadarias e marquises. Neste lado, por onde eu ia, me deparei com uma cena inusitada. Dezenas de grupinhos de adolescentes, tribos particulares, adolescentes vestidos de forma singular, ou nem tanto, singular para eles talvez mas deixando de ser singular a partir do momento em que eles passaram a receber uma classificação.

Emo? Anime? Clubber? Nem sei ao certo classificar aquelas tribos. O que me chamou a atenção não foi a classificação em si, foi o conceito. Me explico:

Olhando aqueles grupinhos de adolescentes, na verdade, foram apenas segundos de observação, eu me dei conta agora de que podia até ter parado, observado com mais atenção, me prolongado mais. O que eu captei naqueles segundos, naquela passagem pela entrada do metrô, foi a necessidade que temos de nos auto-classificar e de sem querer classificar os outros.

Sim, podemos nos considerar descolados. Podemos dizer para nós mesmos: "sou eclético, tenho uma mente aberta e não julgo as pessoas". Mas o fato é que se nos dermos conta, paramos algumas vezes por dia para observar as pessoas e avaliar. Medimos os gostos, as atitudes, analisamos as amostras e emitimos uma conclusão, uma avaliação. O objetivo? Quase sempre coerência. Combinamos variáveis como se houvesse regra pré-estabelecida. Ela gosta de academia + Lê Clarice Lispector = "incoerência", há algo errado.

Sim, alguns, mais do que outros talvez. Cerebrais, melancólicos, intelectuais, instrospectivos. Não sei classificar ao certo. Pessoas que buscam incessantemente uma coerência de gostos e atitudes. Perdem-se no mundo virtual, não no sentido de internet, um mundo virtual existente desde sempre, naquele mundinho próprio que somente eles habitam. Sem querer, por mais descolados, sim somos pessoas singulares, diversas, compreensivas, incompreendidas, buscando ao contrário do que parece, o conceito da normalidade, dentro da anormalidade que é onde nos classificamos.

Olhando aqueles grupinhos de adolescentes, tão distintos e desconhecidos ao meu mundo particular, foi assim que me senti. Cidadã do mundo, experiente nas coisas da vida e da cidade grande, surpreendida por uma cena desconhecida, vestimentas nunca antes vistas, crenças e pensamentos desconhecidos. Eu me senti ignorante por alguns segundos, alienada. Eu me dei conta das fronteiras do meu conhecimento. Eu viajei na imaginação, me entreguei à fascinação do desconhecido e da complexidade da natureza humana.

Confiança e Desconfiança

Recebi um torpedo no outro dia de uma amiga querida, estrangeira. Avisou-me que havia retornado ao Brasil e que gostaria de me ver. Alguns torpedos depois, ficou acertado que eu a buscaria em casa para um chopp. Sim, alguns torpedos depois. É a comunicação moderna.

Olhei o mapa no google maps e muito confiante no meu senso de direção peguei meu carro, alguns nomes de ruas memorizados e segui para o apartamento dela. Troquei o nome de uma rua pelo de outra e estava feito o estrago. Estava perdida.

Segui sem pânico ou preocupação pelo emaranhado de ruinhas escuras e arborizadas sem um ponto de táxi, uma padaria ou um pedestre que pudesse me auxiliar. Fui e voltei, desci e subi, até que numa esquina avistei um senhor de idade que aguardava alguém. Cautelosamente diminuí a velocidade e parei ao lado do senhor, abaixando o vidro do passageiro para solicitar a informação.

Eis que para minha surpresa, o senhor de idade começou a se movimentar devagar mas incomodamente para longe do carro, como quem procurava um táxi. Ele sequer me olhou, ignorou meu pedido de ajuda.

Foi então que eu me dei conta que o que aquele senhor sentia, era medo. Na minha visão uma mulher de boa aparência, bem vestida, num carro mediano, não servia de forma alguma de ameaça. De início me espantei com a atitude dele, achei até um pouco insana. Pensando depois sobre o ocorrido foi que pude entender a inquietação dele. Ele estava sozinho, a pé, no meio da noite. Provavelmente aflito porque nenhum táxi chegava. Ou a pessoa que ele esperava havia se atrasado. Fatos da cidade violenta que habitamos fazem com que esperemos sempre o pior, que haja algo de ruim por trás do que parece bom, esperamos sempre um golpe, uma armação. Uma mulher aparentemente inocente no fundo pode ser uma isca para um seqüestro ou assalto.

Transportei o sentimento desse senhor para o nosso dia a dia, para nossas relações próximas. Percebo que esse temor nos tomou de tal forma que sem querer, estamos sempre armados, sempre desconfiados, esperando que um gesto ou uma atitude esteja acobertando um sentimento ruim, uma intenção de prejudicar. Tentamos nos proteger de ações que não são sequer tangíveis. Ficamos nos protegendo de conceitos e situações imaginárias. Desconfiamos e desconfiamos, revisitamos conversas e atitudes na busca de uma falha, buscando algo que ateste uma mentira.

Fico me perguntando qual a solução disso. Como desconfiar apenas do que nos traz uma ameaça real, um risco de vida ou de assalto. Como confiar, libertando-nos das preocupações cansativas e desnecessárias. Como eu já disse anteriormente, qual a forma de aceitar o nível de comunicação direto, sem elaborar estórias paralelas.

Creio que o natural seriam os sentimentos positivos. Acreditar, ser feliz. Mas inexplicavelmente percebo que lutamos diariamente contra a negatividade. Lutamos para confiar, para não nos sentirmos desanimados ou melancólicos. Ao que parece o natural não é ser feliz. Ser feliz é uma uma opção, uma conquista, quando conseguimos nos libertar dos sentimentos que nos afligem.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A defesa do cara difícil

Como honestidade é difícil e houve muita sinceridade num leitor que se considerou difícil, eu resolvi aceitar o desafio e elaborar uma defesa ao cara difícil, do post da Martha Medeiros.

Veja bem, caro leitor (agora roubando a frase dela), que a crônica da Martha não foi um apelo contra os caras difíceis. Ela foi um alerta. Tanto foi que o conselho final foi que a suposta vítima procure um analista para agüentar a montanha-russa emocional que tal relação irá impor.

No outro dia estava comentando com uma amiga aspectos sobre a genialidade. Já reparou como raramente a pessoa considerada gênio tem uma personalidade estável? Van Gogh? Billie Holiday? Beethoven e tantos outros? Sabe porque isso acontece? No meu ponto de vista são dois fatores: insegurança e inconformidade.

O cara difícil é um cara inseguro. Em geral ele consegue atingir picos de genialidade. Ele consegue resultados acima da média em determinados campos. Nesses momentos ele fica bem e beneficia todos que estão a sua volta com a felicidade que os resultados alcançados lhe proporcionaram. O cara difícil é sonhador, apaixonado e exigente. Quem convive com o cara difícil nestes momentos, pode experimentar sensações jamais vivenciadas porque sonho e felicidade geram experiências inéditas mesmo.

Só que felicidade não dura para sempre. O cara difícil, por ser inseguro, às vezes não consegue acreditar no seu valor. Qualquer comentário pode ser interpretado como crítica. Ele necessita de reafirmação das suas qualidades. Além disso, por ser exigente e inconformado, ao atingir um determinado patamar ele passa a olhar para a frente, a programar o que vem em seguida. O mesmo cara que foi capaz de atingir o céu se força ao inferno, ao isolamento, porque duvida de sua capacidade ou porque esquece das vitórias no momento em que fixa o seu novo objetivo.

O cara difícil usa a comparação com os outros como medidor. Só que nem sempre ele usa as referências corretas ou avalia corretamente os resultados. Com isso, ele pode se magoar, deixar se levar pela irracionalidade, nivelar-se temporariamente por baixo. Ele pode cometer violências consigo próprio que acabam magoando os que estão a sua volta.

Você me pediu, leitor, para exaltar as qualidades, as paixões. É verdade. Não foi à toa que a Martha se deu ao trabalho de escrever sobre o cara difícil. Estar ao lado de um cara difícil e quase sempre uma dádiva. Porque ele sempre contribui com coisas novas e interessantes. O complicado é depender emocionalmente do cara difícil porque tamanha é a oscilação, que a tendência é que quem depende emocionalmente acabe oscilando junto. Nem todo mundo está preparado ou precisa, dependendo das conquistas emocionais que tenha atingido, se submeter a essa inconstância.

Sabe o que eu desconfio, leitor? Eu desconfio que quando a Martha escreveu essa crônica, ela estivesse sentindo muita pena. Não dela e nem do cara difícil. Pena de ter terminado. Acho que ela deve ter conhecido um cara difícil com quem ela tenha vivido momentos inesquecíveis. Que ela em determinadas horas tenha se deixado levar pela ilusão de que realmente ela fosse a escolhida. Que ela tenha enxergado no cara difícil tudo isso que eu descrevi: que ele é um ser que sofre, que não age com o intuito de fazer os outros sofrerem, que ele gostaria de ser mais mediano mas que é uma pessoa que espera sempre mais da vida. Acho que ela deve ter se magoado com acusações injustas, que tenha sofrido por não conseguir fazê-lo enxergar que ela também partilhava de muitos valores e idéias. Que ela era uma pessoa confiável. Talvez ela tenha percebido que ela mesma tenha sido algum dia difícil e que tenha se encontrado, talvez ela tenha lamentado a incapacidade, naquele momento, do cara difícil se encontrar. Talvez ela tenha escrito tudo aquilo, com um desejo secreto de que o cara difícil pudesse ler, enxergar a sua tortura auto-imposta e desnecessária. E que se vendo de fora, pudesse crescer.

Eu como incurável romântica, gostei dessa minha interpretação. E vou ficar aqui torcendo para que a Martha reencontre o seu cara difícil no momento do florescimento. Ou que se não for possível encontrar o mesmo cara difícil, puxa que pena! Que seja então um diferente, mas que valha a pena.

O fim do relacionamento

Eu fiz alguns posts anteontem que revolucionaram o blog. No fundo todo mundo gosta de discutir relações e sentimentos. Eu não sei, posso ter passado a impressão de estar sentindo raiva ou algo do tipo. Não sei definir o que era. Mas não era raiva.

Fiquei pensando sobre todos os relacionamentos que eu tive e que acabaram. Óbvio que tem os mais significativos. O que posso dizer é que mesmo que num momento ínfimo a raiva tenha existido, porque sempre há um momento em que nos sentimos traídos ou rejeitados, nunca o sentimento que perdurou foi a raiva. Sempre foi algo mais ligado ao vazio, à derrota.

Existe todo tipo de relacionamento. Existem os que a gente entra acreditando que vão dar certo e no fim não dão. Os que a gente resolve viver para ver onde vão dar. Os que a gente já sabe de cara que têm tudo para dar errado mas enfia a cara assim mesmo. Acho que no fim aprendi algumas coisas com isso. Pode ser que as minhas conclusões sejam relativas. Eu me considero uma pessoa sonhadora mas com os pés no chão. Seria possível isso? Em geral eu consigo notar o jeito do outro e entender onde as coisas podem me levar. Deve ser por isso que no fim não me sinto tão traída e nem sinto tanta raiva. Talvez nem todo mundo tenha essa clareza de pensamentos, algumas pessoas podem ser realmente fantasiosas demais.

Creio que o conceito de dar certo ou não também é relativo. Ele só existe se tivermos o anseio de que a relação dure para sempre. A partir do momento em que nos livramos desse conceito, passamos a enxergar o tal do "que seja eterno enquanto dure". Eu particularmente penso que raramente relacionamentos irão durar uma vida inteira com sucesso. Penso que eles deixam de dar certo em algum ponto porque as pessoas mudam seus objetivos, um lado amadurece, outro não, as vontades deixam de coincidir. Se é que algum dia coincidiram. Há relacionamentos que começam sem nada em comum.

Todo relacionamento, seja qual for das classificações que eu dei acima, precisa valer a pena. Existem os prós e os contras. Eu ia compará-los a uma balança (mas a balança não tem o lado bom e o ruim) e acabei pensando num eixo, do zero ao cem. O resultado precisa estar próximo ao meio do eixo, mesmo que essa posição não seja estática, que ela oscile de tempos em tempos. Se durante muito tempo ela pende para o lado do zero ou se a oscilação fica do extremo do ruim para o extremo do bom em curtos períodos de tempo, então creio que é interessante fazer uma avaliação e pensar se está valendo a pena ou não.

Seria amadurecimento ou estou ficando boba?

Como já confessei em alguns posts passados, com o passar do tempo o sentimento que está cada vez mais se apagando em mim é a raiva. Eu me explico.

Como boa leonina, eu já fui muito raivosa. Todo leonino é extremado, sente as coisas sempre no limite. Tudo ou nada. Entretanto, horóscopos a parte, creio que a raiva é um sentimento muito comum na juventude.

Quando somos jovens, temos muito pouca visão do que vai em volta da gente. Já comentei isso antes também: alguém não deu bom dia para a gente? Pronto, aquela pessoa (que pode não ter dormido, estar com dor de barriga, pode ter sofrido uma perda recente, que pode ser depressiva crônica) não merece mais receber bom dia da gente. O(s) dias(s) vão passando e a gente vai encontrando em cada pequena atitude dessas, até em relação a desconhecidos, justificativas para se magoar e sentir raiva, como se o mundo girasse em torno de nós.

À medida em que o tempo foi passando e eu fui vivenciando as mais variadas experiências, passei a compreender melhor as pessoas, a enxergar além, a perceber que na maior parte das vezes as pessoas têm atitudes não muito simpáticas ou até ruins, não pelo simples prazer de serem ruins, mas porque se sentiram mal de alguma forma. Mesmo que o ato tenha sido direto, de vingança, por exemplo, existe uma justificativa.

Isso não quer dizer que eu seja um ser superior e que nunca sinta raiva ou que jamais cometa pequenas vinganças. Eu sou humana! Mas posso afirmar com 100% de segurança que conforme os dias passam, cada vez me deixo levar menos por esse sentimento. E quando sou acometida pela raiva, na maior parte das vezes, se ela levou a um ato irracional, eu acabo me arrependendo.

Sonho - Desastre aéreo

Eu estava no trabalho tentando contar para vários colegas o que tinha me acontecido, uma história inacreditável mas ninguém me deixava contar. Eu começava a falar, alguém me interrompia, mudava o assunto.

Eu ficava aflita porque a história era muito interessante, eu me sentia viva, renovada. Mas não conseguia. Eu estava no escritório mas de alguma forma sabia o que havia se passado, apesar de não saber o motivo e nem de lembrar de todos os fatos. Só de uma parte do acontecimento.

Aparentemente eu havia entrado num vôo para Porto Alegre. Não me recordava do pânico e nem de estar sentada dentro do avião. O fato é que após a decolagem, o avião começou a cair mas o piloto, embora não conseguisse mantê-lo na altitude adeqüada, conseguia fazer com que o mesmo se mantivesse numa altitude média, e foi levando assim até que ele chegou nuns campos muito verdes onde conseguiu fazer um pouso forçado.

Eu já não estava mais no local do acidente. De uma forma que eu não conseguia lembrar e nem entender, eu havia sido resgatada. E eu via, não sei como, se na minha imaginação ou numa tela de televisão o avião branco, provavelmente daqueles boeings gigantescos, com alguns detalhes em vermelho próximos às janelas, pousado no meio da relva verde e intacto, apesar do pouso forçado. A "câmera" ia girando e dando vários ângulos do avião mas a visão predominante era a vista de cima, de forma que se enxergava o avião inteiro e pequeno devido à distância. Mais para baixo um rio. E adiante do rio, o que parecia ser um enorme caminhão betoneira, quase do tamanho do avião e muito branco, sem nenhuma sujeira. De alguma forma pensei que o caminhão fosse um trator e que o resgate havia sido feito por ele.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Martha Medeiros - Um cara difícil

Se eu fosse comentar tudo o que a Martha Medeiros escreve, destacar cada frase de impacto, cada idéia com a qual sinto empatia, dava um livro maior do que o próprio livro dela. A questão é, ela não é apenas uma cronista. É uma filósofa do cotidiano, mulher como a gente que sonha, tenta dar conta de tudo, sofre mas não perde a esperança. É como ela mesma diz: "doida". A parte revolucionária do título do livro ("Doidas e Santas").

Li uma crônica que me impressionou muito porque a descrição se encaixou perfeitamente em alguns tipos que já me descreveram. Quando digo perfeitamente, digo no detalhe mesmo, nas atitudes. Fiquei pensando se com toda a nossa diversidade, se todos nós mesmo assim não nos encaixamos perfeitamente em estereótipos. Procurei na web e alguém já havia transcrito e estou copiando abaixo:

Prezada leitora, se um dia você sair com um cara pela primeira vez, motivada a iniciar um relacionamento amoroso, e ele adverti-la dizendo "sou um cara difícil", acione a luz amarela. Ok pode ser que seja apenas charminho dele, uma maneira de se valorizar aos seus olhos - usou o adjetivo "difícil" como oposto de "tedioso". Sim, talvez ele só queira deixá-la ainda mais a fim, dizendo uma frase desafiadora que pode ser traduzida como : será que você consegue dar conta do meu temperamento explosivo, terá atributos suficientes para me amansar e me fazer virar um cordeiro na sua mão? Mulheres adoram esse joguinho perigoso.

Só que pode não ser jogo algum, e ele estar sendo absolutamente modesto na sua própria descrição. Talvez ele não seja difícil e, sim, impossível .

Nenhum de nós é muito fácil, nem homens, nem mulheres. Só o fato de termos sido criados em cativeiro numa família com suas próprias regras, valores e manias já faz de cada um de nós uma aposta arriscada na hora de ter que negociar com uma espécie nascida em um cativeiro diferente. Mas, como relações entre irmãos são veementemente desaconselhadas, o jeito é procurar uma alma gêmea na praia, no bar, na rave, e torcer para que ele não dê o fatídico aviso "sou um cara difícil", porque se ele for mais difícil do que todos naturalmente são, aí danou-se.

O cara difícil vai estar superentusiasmado quando falar com você ao telefone pela manhã, e à tardinha ligará de novo para desmarcar o cinema porque precisa ficar sozinho. E o mais grave: ele vai mesmo ficar sozinho, com a luz apagada, em embate silencioso com seus demônios internos.

Quando vocês estiverem na platéia de um show com três mil pessoas, ele vai encasquetar que um homem de camiseta verde está olhando com insistência para você, e vai ter certeza de que você está retribuindo o olhar, e você vai perder a voz tentando explicar, no meio daquela barulheira, que tem pelo menos 800 marmanjos de camiseta verde em volta, todos olhando pro palco.

Aliás, se estivessem olhando para você, qual o problema, ele não se garante?

Que audácia, você peitou o cara difícil. Ele vai deixá-la sozinha no show e desligará o celular por três dias. Se você não amá-lo, o prejuízo será apenas a bandeirada do táxi que você terá que pegar para voltar para casa, mas se você o ama, prepare-se para esvair-se em explicações e declarações, a fim de trazê-lo de volta à realidade. Um cara difícil exige uma paciência oceânica.

Ele vai ser romântico e muito bruto. Ele vai ser generoso e muito casca-grossa. Ele vai dizer a verdade e vai mentir às vezes. Ele vai fazê-la se sentir uma eleita entre todas e depois vai dar mole para muitas. Ele vai implicar com as mínimas coisas, e com as grandes também. . Ele vai exibir qualidades que você nem sabia que um homem poderia ter, e em troca vai abusar de todos os defeitos que você sabia que todo homem tinha. Ele vai ser ótimo na cama. Vai ser um perigo dirigindo um carro. Vai ser gentil com sua mãe. Vai ser um brucutu com a mãe dele. Ele mudará de humor a cada 20 minutos, ele vai brigar por nada, vai beijá-la demoradamente por horas e, com essa bipolaridade bem ou mal disfarçada, ele a deixará tão tonta e exausta que você pensará que foi atropelada por um trem descarrilhado.

- Quem sou eu? - será sua primeira pergunta ao acordar sobre os trilhos.

No primeiro encontro, pergunte:

- Você é um homem difícil?

Se ele responder que é, procure imediatamente um psicanalista. Para você, santa.

Alimentando o ego

Alguém aí viu "He's just not that into you"?

Scarlett Johansson interpreta uma professora de yoga que tem um amigo que é perdidamente apaixonado por ela. Ela não só não deixa claro para ele que não está apaixonada, como ainda se aproveita da situação. O amigo se torna o porto seguro, aquele que está sempre disponível quando ela sofre uma desilusão amorosa.

Eu tava lendo no outro dia um post no "Elas e Ele", ou seria no "Presente a limpo" . E lá comenta-se que as pessoas não devem se iludir. Que existem ritmos diferentes (nisso eu concordo). Existem pessoas que procuram relacionamentos mais sérios e pessoas que buscam múltiplos parceiros e aventuras. E em seguida, comenta-se que não adianta pessoas do primeiro grupo acharem que podem ser felizes com pessoas do segundo grupo. Também concordo com essa afirmativa.

Além disso, foi falado no post que se o objetivo é estabelecido de início, que não vai haver envolvimento, então que não tem problema. Eu concordo até um ponto porque o fato é que sempre existe o fator imprevisto. O sentimento que não pode ser controlado. Há sempre alguém também que contraria o combinado, secretamente criando expectativas. Por último, diria que existem pessoas como a personagem da Scarlett Johansson que no fundo sabem que é só sexo mas que precisam se sentir amadas e especiais e que por isso criam uma falsa imagem de romantismo fazendo com que o outro se apaixone mesmo que eles mesmos não estejam apaixonados. E se em algum momento forem acusados de simularem a paixão, muito simples: "eu não, você entendeu errado, desde o princípio avisei que não havia compromisso".

Eu concordo com os amigos blogueiros que tudo seria mais simples se as pessoas fossem honestas. Acontece que na prática não funciona assim. As pessoas têm sentimentos confusos, traumas particulares, negam vontades e expectativas. E no fim, o ideal que seria honestidade, acaba sendo o mais raro de acontecer.

Desconstruindo a relação moderna

Eu fiquei pensando numa coisa muito controversa hoje se pensarmos em termos de auto-ajuda e de feminismo. Todo animal possui um instinto de procurar o seu oposto: macho ou fêmea.

Fiquei também pensando no amor de mãe e filho. Do amor incondicional. Pode ser que nem sempre a mãe consiga suprir o amor do filho. Mas é verdade que todo filho busca o amor da mãe. Isso é instinto.

Pessoas sofrem a vida inteira porque não conseguem encontrar um amor verdadeiro. Que não seja para sempre, mas que seja significativo ao menos uma vez.

Aí é que entram as fórmulas baratas de felicidade: você não precisa de um parceiro romântico, existem outras coisas boas na vida. Dedique-se ao esporte, a fazer bem aos outros, você pode fazer sexo sem amor.

Vai tomar no cúúúúúúúú (estou exorcizando, meninas do Inferno Astral). Não seria meio que instintivo as pessoas procurarem o sexo oposto? Não seria o instinto, que também faz parte de nós, interferindo no racional? Tudo bem, a gente pode até compensar de alguma forma. Mas essas outras coisas não substituem totalmente.

E de novo, como no post passado. Quem deseja se apaixonar, quem sonha com o amor, de repente virou fraco. Existem tantas coisas boas na vida, porque você só pensa em se apaixonar? Você nunca estará sozinha, tem filhos e amigos e isso é suficiente.

Se fosse suficiente, as comédias românticas não seriam sucesso de bilheteria e não teria tanto músico escrevendo letra de amor por aí.

E tenho dito.


Pelo direito de ser romântico

Ah, o amor de adolescência. Seja moça ou rapaz, aquele amor platônico. Basta ver o ser amado para perdermos o jeito, coração acelerado. Uma rejeição e a vida perde o sentido. Jamais voltaremos a nos apaixonar.

Vida adulta, tempos modernos. De repente, apaixonar-se tornou-se proibido. Os homens contabilizam as conquistas. Quanto mais mulheres comerem melhor (gente, me desculpem mas hoje vou abandonar o tom educado. Estou ao estilo o mais "Inferno Astral" possível). As mulheres não podem mais se apaixonar. São fracas. A mulher sempre se apaixona e isso é ruim.

Nos tornamos todos "sex-machines". Se não tivermos muitos parceiros, se o sexo não for sempre perfeito e em grande quantidade, se não soubermos separar sentimento de sexo, somos bobos e piores do que os outros.

Às mulheres cabe uma tarefa muito árdua. Quase impossível. Identificar quando o homem é machista e deseja uma mulher intocada, que não tenha desejo próprios e quando está lidando com um canalha, que espera só sexo, diante de quem não se diminua se acontecer de se envolver.

Sexo moderno: fico lendo os blogs por aí. É tudo muito simples, está no contrato inicial: "olha, é difícil eu me apaixonar, não espere muito". Então fica pré-estabelecido que o sentimento nunca pode existir. Não pode haver um encantamento seja pela conversa que rola antes, durante ou depois do sexo. Ficou tudo muito claro: "é só sexo". E quem se deixou levar, quem se apaixonou, tornou-se um fraco, não soube respeitar as leis modernas.

É tudo tão simples. Basta casar melancia com melancia e mamão com mamão. Frutas ou animais a parte, é simples como o canário que olha o canário e facilmente identifica o seu parceiro. Não há papagaios se fazendo de canários. O canto é sempre bonito, nunca é um grasnar se fingindo de canto. Sim, o ser humano, racional, consegue controlar seus sentimentos 100% do tempo.

Se até animais morrem de tristeza quando perdem seus donos. Porque não haveríamos nós de nos permitir sofrer por amor? Eu me lembro no passado, na juventude, de ter sofrido meses por um amor perdido. De repente isso não é mais permitido. O homem que sofre é menos macho e a mulher que sofre é submissa.

O preço que pagamos por essas crenças modernas? A perda da inocência, a perda do valor do simples, da riqueza de um olhar, de um toque involuntário e inesperado. O que ganhamos: a desconfiança. Não acreditamos mais na palavra, sofremos ciúmes doentios. Temos tanto medo de sermos traídos, porque a traição segundo a crença moderna é tão fácil, que traímos pelo simples medo de perder, pela competição ("já que vou levar um chifre então faço eu primeiro"). Homens e mulheres, perdidos na descrença, na incapacidade de amar verdadeiramente. Deixamos de viver momentos belos. Propagamos o trauma e os sentimentos ruins. Que seja só sexo!

Pelo direito de ser infeliz

Hoje eu acordei com o espírito do contra. Sim, fiquei com vontade de escrever tudo ao contrário. Eu me dei conta de que há algo cruel na teoria do "Carpe diem", de buscar a felicidade, da auto-ajuda.

Descobri que é proibido ser infeliz. Sim, tudo o que se prega hoje em dia é que sejamos felizes. É necessário ser sempre eficiente e feliz.

Fiquei pensando no seguinte: ficar infeliz muitas vezes é necessário. Não estou defendendo a depressão. Que fiquemos anos a fio afastados do mundo sofrendo. É bem verdade que eu já vi gente que deixou de viver achando normal e concordo que não é bom.

Depressão é muito diferente de ficar triste, de ficar infeliz, mesmo que a infelicidade dure alguns meses ou alguns anos.

A gente passa por provações na vida: desilusões, perda de entes queridos, fatalidades que nos tiram alguma capacidade, doenças. Tudo o que se ouve hoje em dia é que não podemos nos
deixar abater.

Concordo que não se pode deixar abater para sempre. Entretanto, estamos esquecendo de que
em determinadas situações, é permitido sofrer. E nem sempre por um período curto de tempo.
Pode ser que necessitemos de um tempo maior para nos recuperar.

Vou abrir demais o meu coração agora. Ano passado eu enfrentei duas "paradas" muito duras: descobri que meu pai tinha uma doença terminal (e ele acabou falecendo no início do ano)
e terminei o meu casamento.

Eu não deixei de trabalhar, não deixei de cuidar dos meus filhos, não deixei de pagar minhas
contas, não deixei de sonhar. O tempo todo, em meio ao sofrimento, eu procurei manter pensamento positivo e fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para ficar bem.

Descobri entretanto que não importa o que se faça, principalmente quando somos eficientes demais, que seja suficiente. As pessoas sempre esperam mais. Você não pode deixar de nutrir os sentimentos dos seus filhos, mesmo que esteja com o coração esfacelado. Você não pode render menos no trabalho, não é permitido errar, mesmo que as pessoas te conheçam há anos e já tenham presenciado mostras das sua competência. Você não pode beber um pouco demais, você não pode perder os objetivos, mesmo que os tenha tido por uma vida inteira e nunca tenha perdido o foco neles, você não pode se sentir perdido.Você não pode tirar um day-off; qualquer uma dessas ações, mesmo que você tenha sido aluno exemplar, tenha passado no vestibular para faculdade de "ponta", fale 3 línguas, seja bom profissional, uma pessoa honesta, tenha conquistado crescimento pessoal e material: no momento em que você se entregue a qualquer uma dessas atitudes, passa a ser fraco, um perdedor, como os americanos gostam de dizer. O mundo está pronto a olhar, julgar e condenar. Nós mesmos estamos prontos a ditar a
nossa própria sentença.

Pretendo desconstruir uma série de mensagens, uma série de conceitos. Sim, porque estou muito subversiva hoje. Estou contrariando até a modernidade.

Sonho - Reforma não autorizada

Eu acordo de manhã e entro na lavanderia (área de serviço). As paredes que eram brancas estão pintadas da metade para cima de preto. O teto também está todo preto.

Eu fico tentando entender o que pode ter acontecido. É então que aparece uma empregada nova. Eu me lembro que contratei uma nova. Ela me diz que o interfone tocou, avisaram que o pintor estava subindo para fazer o serviço e ela autorizou a entrada. Eu digo para ela bastante irritada:

- Tinha que me perguntar antes! Eu não estava esperando nenhum pintor! Nunca autorize a entrada de estranhos sem antes confirmar comigo.

Ando pelo apartamento e encontro outros dois cômodos alterados. Os forros de gesso foram retirados e avista-se canos e um teto chapiscado. Eu me desespero. Eu penso: "faltava tão pouco para terminar a obra e agora terei que refazer um monte de coisas que já estavam prontas".

Tento reclamar com o porteiro. Ele alega que deixou o pintor entrar porque ele mencionou o nome de uma pessoa conhecida. E eu lhe respondo que foi um engano porque não há ninguém com aquele nome morando lá e nunca houve.

Penso numa forma de reclamar com o síndico e de fazer os cômodos voltarem ao que eram. Sinto um enorme cansaço.

domingo, 17 de maio de 2009

Finalmente eu fui




O som é excelente. Dá para dançar numa boa, sem muvuca e sem ficar com zumbido no ouvido depois.


Ameeeei!

sábado, 16 de maio de 2009

Pequena vingança

Eu fico lendo as histórias do Felipe e morrendo de rir. Fiquei pensando sobre as piadas e as brincadeiras que eu sempre fiz e diria que o meu estilo é totalmente diferente, é um estilo muitíssimo mais sutil. É a tal coisa, questão de estilo. O que não quer dizer que eu não ache outros estilos engraçados também.

Fiquei tentando lembrar de alguma brincadeira mais radical que eu tenha feito no passado. Aí lembrei de uma historinha que não vai fazer nem cócegas perto das do Felipe, é até bonitinha.

Tinha um cara que estudava comigo no 1o. ano do segundo grau, o J. Ele era estrangeiro, acho que morava no Brasil havia alguns anos. Pat Ferret não tem a melhor das memórias mas vai lembrar dele, eu acho.

J. era um cara que sentava na primeira carteira do meio da sala e prestava atenção em tudo o que o professor dizia na aula. Fazia perguntas durante a aula e depois da aula ficava batendo papo com os professores. J. era CDF e um pouco mala.

Eu me sentava no meio de uma fileira do canto, me sentia meio excluída porque era nova no colégio, achava tudo muito chato, tinha amigos "vadios" e passava muitas aulas jogando batalha naval com a menina que sentava atrás de mim. Eu também era CDF mas era um tipo mais largado de CDF.

Um belo dia, J. deu para se aproximar de mim. Até que ele tinha bom papo. Contava umas coisas da terra dele e me dizia que gostava de escrever poesia. Ele me mostrava umas poesias dele e eu (apesar de nunca ter gostado de ler poesia), achava que algumas era realmente muito boas.

Eu não lembro exatamente como começou a história. Acho que foi porque ele transcreveu uma poesia numa folha de caderno e me deu. Eu fiquei bastante constrangida mas aceitei a poesia e guardei.

Eu tinha uma grande amiga que era exímia escritora. Ela lia muito, desenhava e gostava de mais estilos literários do que eu. Eu a conhecia do curso de inglês e ela morava a uma quadra de casa. Muitas vezes eu chegava em casa, tomava banho, almoçava e me debandava para a casa dela.

Naquele dia, obviamente, levei a poesia. Minha amiga nem bem começou a ler e disse:
- Mas isso aqui é de Fernando Pessoa, porra!

Caímos numa gargalhada sem fim. Naquela época, qualquer coisinha era motivo para a gente ter ataques de riso.

A minha amiga era bem mais maldosa do que eu. Dar de presente uma poesia de Fernando Pessoa manuscrita como se fosse de autoria própria nos pareceu algo digno de vingança, de receber uma lição.

Foi então que começamos uma troca de cartas com J. Escrevemos uma carta apaixonada para ele (essa sim, de autoria própria, com direito a versinho e tudo). Eu cheguei no dia seguinte no colégio e contei para o J. que uma amiga tinha gostado do poema dele e que como ela também gostava de escrever, quis se corresponder com ele.

As cartas continuaram. E quanto mais J. se empolgava, mais apaixonadas eram as respostas. Até que pensamos no golpe final: marcar um encontro. Minha amiga tinha um desafeto. Uma amiga que havia lhe roubado o namorado. A ladra de namorados era bastante bonita. Adicionamos a foto da menina na carta seguinte e estava pronta a isca.

J. ficou louco. Queria marcar o encontro. Pensamos no lugar, no horário, em tudo. Eu não podia ir espiar, muito arriscado. Naquela época a cidade era mais vazia, ele poderia me ver. Minha amiga com outra foram lá olhar.

Mas J. não apareceu. J. amarelou.

No dia seguinte, no colégio, perguntei a J. o que tinha acontecido. E ele cabisbaixo me respondeu: - Não sei, não tive coragem.

E foi assim que terminou a história de J. História de mentira, vivida em carta e sem final feliz. Como muitas histórias por aí. A vingança ganhou um ar de melancolia.

As cartas foram guardadas. Minha amiga ficou com elas. J. continuou meu "amigo" mas nunca mais falou no assunto. E no final do ano, J. voltou com os pais para o país de origem. As amigas da Pat, que eram amigas mais verdadeiras do que eu, ainda falaram com ele por carta (naquela época não havia e-mail) mas eu nunca mais soube de J.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Parece até presente

Palavrinhas de confirmação curiosas sempre aparecem para mim no blog da Pat. Ela ainda não me esclareceu a mágica disso. Essa semana andei me sentindo como se precisasse de um abraço, de que alguém dissesse para mim: "gosto de você de verdade". Vou tomar essa palavra como um carinho inesperado, por mais aleatório que seja o fato.



quinta-feira, 14 de maio de 2009

Dessas coisas paradoxais

Algumas pessoas vivem exigindo ou esperando dos outros que sejam da maneira como elas os idealizam. E quando percebem que a mudança não é possível ou não é imediata, se magoam, se revoltam.

Entretanto quando os outros lhe dizem em troca o que esperavam delas, o que pedem é que sejam compreendidas. Clamam para que aceitem o seu jeito como se nascêssemos todos estáticos, imutáveis.

Além de paradoxal, eu me pergunto: seria egoísmo, conformismo ou o quê? Não fica parecendo que o mundo, este particular, gira em torno delas?

E aprendeu a se calar

Lamentavelmente desde muito cedo, cedo demais, foi obrigada a conviver com a agressão do silêncio. Silêncio incômodo, rígido, raivoso.

No início não conseguia compreender o que podia justificar a agressão. Corroía-se de culpa sem saber o motivo. Era obrigada a rever atos que não compreendia.

Mais tarde, por ironia do destino, tornara-se por demais eloqüente e tratava de explicar. Discussões sem fim, sem ganhador, só perdedores. E de novo era agredida com o silêncio. A culpa ainda lhe acometia. O silêncio vencia.

Com o tempo deu-se conta de que quem se fecha com o silêncio magoado, raivoso, na verdade se fecha para o mundo. Não consegue aceitar que existam no mundo pessoas diferentes, com diferentes opiniões e vontades. Que nem sempre se tem razão. Ou que nem sempre vale a pena ter razão. E que na incapacidade de reconhecer e lidar com esse fato, agride as pessoas com o silêncio. Agressão covarde contra a qual não existe defesa.

Foi então que aprendeu a se afastar e a se calar. De nada adianta tentar explicar fatos a quem não quer ouvir e nem refletir. Perde quem se fecha à oportunidade de superar as crises. E por incrível que pareça, muitas pessoas escolhem esse caminho. O mais difícil e solitário.

Muitas vezes teve vontade de dizer:

"Olha, preciso sair com meus amigos. Eles são imperfeitos como eu mas são bons e estão aprendendo." Mas se calou.

"Amiga desculpe. Eu cometi um erro e não posso voltar atrás. Entretanto é um fato pequeno diante da nossa amizade e vale a pena perdoar". Mas se calou.

"Você é especial para mim mas eu não sou para você. Você brinca com os sentimentos das pessoas e isso eu não posso aceitar". Mas se calou.

"Eu aprendi a enxergar meus exageros e amadureci. Mas você não conseguiu rever os seus e se tornou mais egoísta". Mas se calou.

"Você foi importante na minha vida e isso jamais será esquecido mas você sempre prioriza os seus objetivos e eu gostaria de companheirismo, respeito, confiança e serenidade". Mas se calou.

"Tudo parece melhor com você mas eu não posso aceitar só o que você quer me oferecer". Mas se calou.

"A qualidade que torna a jóia preciosa é a sua raridade. Não se deve pagar pelo plástico e pelo diamante o mesmo preço". Mas se calou.

"Você não me conhece e não deveria me julgar pelas escolhas que fiz e que nem sequer te afetam". Mas se calou.

"De uma forma estranha eu compreendo que nem tudo o que se faz com efeito negativo é com o intuito direto de prejudicar. É o que se é diante de todos, é indiscriminado". Mas se calou.

"Não se deve tomar como pessoal algo que não é pessoal". Mas se calou.

Foi um silêncio amadurecido e escolhido e por isso menos dolorido. Não com sentimento de derrota ou de vingança. Foi um silêncio conciliador pois de nada adiantaria argumentar.

Quem se calou primeiro escolheu a própria verdade, ficou com o sentimento amargo. Escolheu a rejeição. Escolheu se sentir menor do que realmente é.

Calou-se então, não com a conformidade total. O desconforto não se anulou por completo. Mas a culpa deu lugar ao lamento. Pelo desperdício. Por observar que poderia ser melhor se a outra parte pudesse enxergar. Se não fosse cultivada a mágoa. Se não fossem elaboradas interpretações erradas. Se fosse possível compreender que nem sempre é suficiente apenas "ser". De tempos em tempos é necessário revisar o que se é para se tornar melhor e mais feliz. É um clichê mas é verdadeiro: nascemos aprendendo e continuamos aprendendo até o último segundo que antecede a morte.

Não gostaria de terminar com um clichê. Mas a vida muitas vezes é assim. Feita de clichês.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Insegurança

Certa vez eu tive um amigo muito especial. Tínhamos em comum o bom-humor e a música. Após horas e horas de conversa, uma coisa levou a outra, um convite para um sábado à noite e começamos a namorar.

Em pouquíssimo tempo de namoro, um desentendimento. Um final de semana perdido, algo a ver com ele ter que ir à opera com os pais. Comunicação truncada ao telefone, traumas passados rondando. Em cima de meras suposições concluí que não havia nada a fazer senão terminar.

Minha pressa foi tanta com a minha pobre conclusão, baseada em pouquíssmos fatos reais e muita imaginação que não consegui me conter. Num ímpeto peguei o telefone de volta e terminei em poucos minutos algo que havia sido construído ao longo de alguns meses. Terminei aparentando frieza quando o sentimento era puro medo.

Feita a besteira, chorei. Chorei nos dias que se seguiram e por pelo menos mais um ano lamentei a perda, a precipitação. Algumas vezes pensei em me desculpar, em voltar atrás. Mas o medo não me permitiu. Eu me deprimi, bombei em matéria na faculdade, rejeitei outros amores.

Acho que foi depois desse ano inteiro, só depois que consegui superar a experiência, que concluí que não poderia nunca mais deixar de viver uma emoção por pura insegurança, por orgulho. Medo de ser rejeitada, de levar o "pé" primeiro. Eu me prometi experimentar sem medo o que me fosse oferecido de interessante. Enquanto valesse a pena, enquanto houvesse algo a agregar. E o mais importante de tudo: eu me prometi nunca mais basear as minhas conclusões em hipóteses. Em histórias imaginadas, monstros particulares. Prometi que a partir deste dia, tomaria decisões mais acertadas, baseadas em análises mais demoradas de fatos concretos, combinando o resultado com a constatação do que fosse importante para mim, pelo seu valor essencial, despido de orgulho fútil.

Em toda relação existe a soma e a subtração. Os valores são ponderados. Cada característica recebe seu peso no cálculo da média. Se os fatores de redução do equilíbrio não podem ser mudados, não há o que fazer. Sim, por insegurança cometemos erros terríveis. E é por isso que não me permito mais me dominar por ela.

Cruzeiro das Loucas

Tem coisas que a gente pensa que só acontecem em filme...

Assisti há umas semanas atrás o filme "Cruzeiro das Loucas". Preciso dizer que sempre fui fã de comédias. Desde as mais intelectuais até videos caseiros do Youtube, quase tudo me diverte. Esse filme, é daqueles bem canastrões americanos e tem umas cenas bem engraçadas.

Em linhas gerais, o filme é sobre dois solteiros que pensam em se dar bem num cruzeiro mas que por uma vingança do agente de viagens, acabam num cruzeiro gay. Após uma série de situações cômicas, há um momento em que se notifica aos tripulantes que há um outro navio à deriva próximo a eles.

Eis que ocorre um resgate de uma dezena de escandinavas loiras (obviamente) e gostosonas. Bem ao estilo "Baywatch", peitão e maiô vermelho.

Numa certa segunda-feira, onde eu passei um dia infernal e saí muitíssimo tarde do trabalho, após um final de semana de marasmo total, recebi um telefonema de uma amiga. Ela também estava num humor complicado. Combinamos de nos encontrar num bar e chorar as mazelas.

Estávamos lá, naquele movimento de segunda-feira, bar vazio. O bar que frequentamos assiduamente e que nunca teve música ao vivo, naquele dia tinha um triozinho que ironicamente cantava tudo o que se possa imaginar de depressivo, de Coldplay a Kansas, no estilo o mais "Dust in the wind" que se possa imaginar.

Após uma hora de lamentações passadas e futuras (apesar de que mesmo no meio da lamentação eu sempre encontro momentos de bom-humor, como já relatei anteriormente), fizemos uma pausa num determinado momento. Parecia pausa programada, daquelas de filme. Pausa em que a gente pára os olhos num determinado ponto, vê uma cena que inicia e não acredita no que está vendo. Digamos assim, que se fosse filme, eu abriria a boca e esfregaria os olhos.

Entravam no bar, um após o outro, cerca de 17 gringos. Minha amiga achou que eram alemães. Eu, não sei porque, cismei que eram suecos. Foram entrando e se aproximando de uma mesa em frente à nossa. Ficamos as duas, tal qual os americanos do "Cruzeiro das Loucas" observando incrédulas em plena segunda-feira de bar vazio, as beldades escandinavas que se acomodavam na mesa em frente. Tinha um que era a cara do vocalista do A-ha nos áureos tempos (tudo bem, ele não é sueco). Mas só para sentir o drama.

No fim, foi só isso. Mas que foi legal, foi.

Crítica de arte II

Menina de 5 anos lendo o livro ilustrado a lápis na página em que a menina projeta uma sombra na parede:

- Mamãe, quem desenhou esse livro é muito bom porque fez até a sombra na parede. É difícil artista desenhar a sombra. Esse artista aí deve ser muito famoso.

Crítica de arte I

Menina de 5 anos olhando para o quadro no restaurante pra lá de impressionista:

- Mamãe, eu tô olhando para aquele quadro e eu entendi tudo o que ele fez ali, tem até uma corneta mas mesmo assim não tô gostando muito não....

terça-feira, 12 de maio de 2009

A arte de ser feliz

O perigo da cultura de massa é receber as mensagens de uma forma simplificada demais. Hoje em dia a gente ouve o tempo todo por aí: "cease the day", é preciso retirar a alegria das coisas simples, aproveitar os momentos, buscar a felicidade e tudo mais.

O grande problema de se perseguir essa mensagem tal qual ela é dita na televisão, no rádio, na revista, nas propagandas é que acabamos atingindo a satisfação imediata e não o bem-estar duradouro. Tudo hoje em dia precisa ser rápido e simples, precisamos cumprir métricas até na vida pessoal. Acaba que a felicidade se resume a momentos de prazer corriqueiro, bebida em excesso, consumo em excesso, sexo em excesso, balada em excesso. Acabado o prazer, volta-se para casa com a sensação de vazio. A felicidade tão almejada acaba se transformando em vício.

A gente ouve o seguinte: que para aprender a ser feliz, é necessário pensar mais em si próprio, aprender a dizer não e a se permitir mais. O problema é quando a pessoa é infeliz por não se amar de verdade, não visualizar suas qualidades, seus talentos. Porque às vezes ela até tem o foco nela mesma, pensa nos seus objetivos como indivíduo, luta pelos mesmos. Só que não atinge o máximo do que é capaz por se enxergar menos do que realmente é.

Quando o impedimento para a felicidade é a baixa auto-estima e se junta a mensagem truncada que eu mencionei anteriormente, está feito o desastre. Porque neste caso, o que se consegue não é o crescimento de verdade. Muitas vezes, a busca acaba privilegiando o egoísmo que acaba nem sendo notado, já que existe a desculpa para se comportar dessa forma, a desculpa de ser feliz. Então, não importa que se minta, que se exija o máximo do outro, sentimentos verdadeiros, sem oferecer a verdade em troca. Porque o que importa é ser feliz.

Reconheço que não é fácil equilibrar a balança. Saber o quanto que se deve de um lado "se permitir" e do outro ceder. Por outro lado, quem sempre vê o lado do outro, quem sempre se coloca no lugar e tenta ser compreensivo, acaba voltando à estaca zero, deixando de viver experiências enriquecedoras por colocar o outro sempre como prioridade.

Creio que neste caso, um bom medidor é sempre a permanência da alegria. Posso dizer com muita convicção que ninguém consegue viver sozinho. O quanto mais afastamos pessoas com nossos atos, menos estamos sendo eficientes na compreensão do que é buscar a felicidade. No fundo o que todos queremos é ser amados. Alguns precisam do amor dos pais, outros do amor de alguém especial, do amor dos filhos, das pessoas em geral. Estamos sempre buscando o amor de alguém; o amor que parece óbvio nem sempre é tão óbvio assim, ele pode existir sem ser sentido, tornando-se assim praticamente inexistente. Ou pode não existir de verdade, numa relação onde todos crêem que ele seria natural.

Na busca do amor, seja qual forma ele tiver, sempre corremos o risco de não sermos correspondidos. Há amores na vida que nunca retornam da forma como a gente espera. Não estou falando só sobre amor entre homem e mulher. Estou falando até de relações familiares. Não adianta lutar contra, em alguns casos é preciso apenas aceitar, seja porque a relação é difícil de resolver ou porque sem querer acabamos almejando algo impossível. O amor correspondido precisa sempre do consentimento da outra parte, consentimento que não conseguimos controlar, que não cabe a nós decidir e nem provar.

É nessa hora que entra a auto-estima. Porque se aprendemos a nos amar de verdade, essa sensação por si só já alimenta a nossa "carência". Atraímos para perto de nós outras pessoas que podem não ocupar exatamente o lugar daquilo que nos falta mas que podem nos ajudar a preencher a lacuna. Estou falando de pessoas de verdade, a quem ajudamos sem esperar nada em troca. E que por fim acabam nos presenteando pelo reconhecimento do sentimento de confiança e colaboração.

Quem sabe até se num determinado momento, quando nos saciamos com outros tipos de amor, aquele que parecia primordial pode até perder a importância, pois certas coisas são assim. Com a experiência aprendemos a valorizar coisas diferentes e aquilo que parecia insubstituível no passado, um belo dia acaba se tornando menos relevante.

Martha Medeiros - Doidas e Santas

Fui acometida nessa noite por uma insônia. Talvez insônia não seja o termo. Eu acordo durante a noite com muita freqüência, às vezes durmo logo, outras vezes não. Pois hoje à noite, resolvi ler um livro e o perigo de pegar um livro para ler no meio da noite é que ele seja bom e a gente não consiga largar.

Estava há muito tempo com esse na cabeceira, "Doidas e Santas" da Martha Medeiros. Tive que me forçar a largá-lo para voltar a dormir. Vocês devem estar se perguntando: e o de entrevistas de Woody Allen? Pois é, está lá, "on hold". Porque eu sou assim mesmo, desde que me entendo por gente leio de 3 a 4 livros ao mesmo tempo. Agora até que está mais tranqüilo, são apenas dois.

O fato é que eu estava meio sem estímulo para escrever. Acho que inspiração sempre existe, só que em alguns momentos a vontade simplesmente não vem. Lendo o livro da Martha Medeiros, quase que piorou o meu estímulo porque sobre tantas coisas sobre as quais eu gostaria de falar e acabo me privando ou não consigo organizar na cabeça ela discorre de uma forma tão natural, com tanta beleza, que me senti muito incompetente. Fiquei até com medo de ficar lendo e na tentativa de abordar um mesmo tema acabar, sem querer, repetindo algo que ela falou.

É isso. Leiam Martha Medeiros.

Sonho - Saguão do hotel

Encontro um amigo. Ele me diz que vá com ele receber a mãe que chega de viagem. Eu chamo a minha mãe e vamos caminhando os três pela rua, ele mais à frente e nós duas o seguindo.

Chegamos numa praça muito movimentada, parece que está havendo um festival, uma comemoração. Ele, sempre de costas para mim, diz que a mãe está logo em frente, no meio da multidão. Do meio da confusão surge um "bell-boy" com um carrinho carregado de malas. Ele entrega algo ao meu amigo que por sua vez o entrega a mim.

Eu pego o objeto pequeno, formato de violino. Ele está embalado numa capa parecendo de violão, apesar de violinos normalmente serem guardados em estojos rígidos. Eu pergunto para o meu amigo: "é um violino?", porque ele parece ser muito pequeno para um violino, mas ele diz que sim.

Entramos no saguão do hotel, tão cheio quanto a praça. A decoração é toda em vermelho e dourado. O local não é muito amplo mas no canto direito, há uma pequena orquestra e no fundo da orquestra a parede é toda forrada de nichos retangulares. Alguns músicos, os de trás, estão num nível acima, quase encostando no teto. Dos nichos saem luzes que apontam para o teto.

As pessoas no saguão, predominantemente chinesas, recebem massagens e outros tratamentos terapêuticos. Uma senhora se aproxima da minha mãe e lhe diz que tente uma massagem; que ela nunca havia feito e que tinha sido muito bom.

Eu fico observando o ambiente enquanto o meu amigo, ainda sem me olhar, separa uma pérola para me entregar. A pérola está no meio de um prato contendo o que parece ser farinha de trigo.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Sinceridade e Mentira

Com essa mania minha de ficar só falando de Woody Allen, algumas pessoas acabaram se interessando. Um amigo meu me escreveu dizendo que já tinha visto uns filmes só não sabia que eram dele. Sobre “Vicky Cristina Barcelona”, ele me disse que achou muito engraçado o início do filme quando o personagem do Javier Bardem convida as duas americanas para passar o final de semana com ele e para ficarem todos “juntos”. Meu amigo me perguntou se essa naturalidade para tratar da questão poderia ter algo a ver com o fato do cara ser artista. Eu diria que pode ter a ver sim, mais liberdade de expressão e de costumes. Mas respondi para ele que além disso, existem pessoas que são mais sinceras mesmo, que fazem menos rodeios.

Se pararmos para pensar, a gente sempre procura dar desculpas para as coisas com o medo de ser indelicado. Eu conheci uma pessoa que uma vez, ao ser convidada para passar a tarde na casa de uma amiga, respondeu: “hoje não”. Ao que a amiga indagou: “por quê?” e a resposta foi: “porque não quero”. A amiga, já acostumada com a sinceridade costumaz, à comunicação pura e simples, não se ofendeu e ainda comentou: “é isso aí, sinceridade total, sem nenhum rodeio”.

Eu diria que com os alemães com quem eu trabalhei, também eram assim. Lógicos, práticos. Sentimentos latinos à parte, eu diria que este tipo de comunicação facilita muito as coisas pois elimina todas as mensagens subliminares, todos os níveis abstratos que possam ficar pairando no ar.

Adicionalmente, disse ao meu amigo do e-mail que existem pessoas que lidam com a sinceridade na mesma medida em que outras lidam com a mentira. Sim, pelos motivos expostos anteriormente, ou por motivos pessoais, não há quem não minta. A mentira pode ser pequena, como a desculpa para não comparecer ao aniversário do amigo, ou grande. Então não sejamos hipócritas e nem críticos demais, no fundo todo mundo mente.

O que pode incomodar na mentira é quando ela se torna excessiva ou frequentemente proposital, deixando de cumprir o papel de proteger o outro da verdade e aproximando-se do limiar da maldade. Quando se torna diária, ao ponto de confundir ou mascarar desejos reais e contínuos. Fica difícil de conviver com quem se habitua a mentir porque a conversa se torna inútil. Não adianta ouvir frases nas quais não se acredita porque no fim, não sabemos o que responder. A conversa se torna abstrata demais. A pessoa que se acostuma a mentir acaba criando um mundo virtual, para ela e para os outros, mas que aos poucos começa a ser percebida pelos que a rodeiam. Porque num determinado momento, a mentira e a verdade ficam tão misturadas que o controle é perdido e o que é dito num dia é desdito no dia seguinte.

Hoje em dia estou longe de julgar o que é certo ou errado. Se melhor é ser sincero demais e abolir as mentirinhas, ou se é possível ser feliz mentindo o tempo todo. O que posso dizer é o que serve para mim. Eu não consigo contar grandes mentiras e nem conviver com alguém que seja tão “escapista”. Mas isso é a minha forma de pensar. Por outro lado, posso me magoar em alguns momentos com sinceridade demais. Acho que a medida no final é sempre o nosso bem-estar. O quanto compreensivos ou exigentes podemos ser diante das situações.