sexta-feira, 26 de março de 2010

O ser social e o ser pessoal


O maior problema nos relacionamentos é a constatação e a aceitação do que somos intimamente versus o que somos dentro da relação.

O ser humano apesar de um ser social, e eu ia utilizar neste momento a palavra "postulado" mas talvez "axioma" se aplique melhor, parece nascer centrado nele mesmo. Não nascemos sabendo conviver e atuar com as boas práticas do convívio social. Nascemos pensando em nós mesmos, no que queremos da vida, no que somos e em como o "mundo" precisa ser para interagir com o nosso pequeno universo.

Aí é aquela velha história do jovem que leva vida dupla. Em casa ele é certinho e não fala palavrão e no colégio ele se solta com os amigos. Está errado isso? Creio que não. Intimamente ele pode ter qualidades como o respeito aos pais, a vontade de se acertar na relação familiar mas no fundo ele necessita ser mais livre, expressar-se de uma forma mais ousada que não necessariamente implica em agir de uma forma agressiva. Seria o que eu quero dizer com o ser social, o que o jovem é perante os pais, respeitando as regras que aquela relação impõe e o que ele realmente quer ser socialmente e que transparece com os amigos, mesmo que permeado por outras regras que aquele grupo acaba impondo também.

No outro dia eu li na Caras (sim, eu pratico a leitura diversificada...) que a modelo Raica declarava que detesta homem romântico. Quanto mais meloso, mais ela quer distância deles. Então eu pensei: "ora, então ela tem que evitar mesmo". Porque quando existimos numa relação, e aí não precisa ser somente amorosa, pode ser qualquer relação, reprimindo o "ser pessoal", isso se transforma numa bomba relógio ou no pivô de conflitos intermináveis. Quer prova mais espontânea do ser íntimo do que a forma como uma pessoa deseja demonstrar o afeto pela outra?

E é então que eu chego no cerne desta minha reflexão: que muitas vezes nos magoamos ou os outros se irritam conosco por coisas que são vistas como propositais: "você fez isso que eu não gosto". Quando na verdade, a pessoa está "sendo". É assim que ela é, na relação familiar, afetiva, de trabalho. E ela não precisa mudar aquele aspecto se não a incomoda. E ela não vai mudar porque é algo enraizado, que define sua personalidade, que mesmo que a incomode, pode levar tempo se ela tentar mudar. E aí entra outra coisa que parece existir dentro das relações: a fixação de um perfil geral que montamos dentro da nossa cabeça. Congelamos uma imagem de como a pessoa é, e somos incapazes de enxergar as mudanças que o outro procura promover em si mesmo em prol da relação. Qualquer deslize, qualquer ato que remotamente lembre a forma de agir anterior joga por terra abaixo todo o trabalho que vinha sendo feito.

É por isso que se ouve tão frequentemente a frase: "quero alguém que goste de mim como eu sou". É a desistência, o cansaço de tentar mudar e não ser reconhecido falando alto. E é por isso que a gente não pode gerar expectativas. A gente não pode ficar esperando uma determinada atitude de outra pessoa diferente de como ela costuma agir porque a expectativa pode estar sendo baseada em algo distante do que o outro realmente é.

Viver relações sem cobranças e sem expectativas não é fácil. Por último, e como sempre, vou dizer que a maior parte das coisas sobre as quais eu reflito aqui, para as quais eu procuro dar uma solução, parecem lógicas mas são rapidamente boicotadas pelo sentimento e principalmente pelo egocentrismo. Não é porque a gente acha que deve ser feito que a gente consiga fazer. Mas gosto de pensar que são exercícios. E que um dia a gente vai passar na prova, nem que seja na média.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Uma nova perspectiva


Há coisas que me parecem óbvias mas que não deixam de se tornar cada vez mais óbvias conforme o tempo vai passando e eu as vou praticando. Com relação a ler, a se informar. Eu não canso de me surpreender com as diversas facetas e visões que vou adquirindo através da leitura ao longo dos tempos. Bom, isso também acontece com bons filmes.

Estou lendo "A menina que roubava livros" de Markus Zusak. Eu diria que o aspecto destacado por este meu post nem é o que mais surpreende no livro. O bacana do livro é a estrutura em si, a disposição inusitada dos parágrafos e principalmente a personificação da morte, a poesia com que ela nos fala dos momentos em que as vidas são levadas por ela e até os questionamentos que ela se faz sobre o seu "trabalho". Genial.

Voltando ao assunto principal, a imagem que ficou marcada de um modo geral foi a do judeu subjugado pelo Nazismo e pelos horrores do Holocausto. Não tenho dúvidas de que foi de um sofrimento inimaginável. O que me incomoda nessa história a partir do momento em que começamos a conhecer outros relatos como o que o livro expõe tão bem, mesmo em forma de ficção, é a unilateralidade. Sim, porque o povo alemão ficou como um todo com a fama de mau. Só que com menos frequência ouvimos falar daqueles que mesmo sendo alemães não compactuavam com o regime e que se em determinados momentos agiam de acordo, era por pura coação, por medo. Poucos conhecem o martírio daqueles que viam seus filhos sendo levados para batalhas impossíveis de serem vencidas, das crianças que já na escola sofriam os rigores e a lavagem cerebral, da fome, do medo dos bombardeios, das mortes e da destruição que enfrentavam nas cidades alvo.

O filme "A Lista de Schindler" hollywoodianamente mostra o esforço de um militar de alto escalão na luta para salvar judeus dos campos de concentração. Na época em que foi lançado lembro-me que revolucionou a forma de ver o Nazismo pois pela primeira vez um militar alemão em pleno período de guerra foi retratado fora do papel de mau. E por americanos.

Uma das belezas da maturidade bem informada é que com o tempo vamos ficando cada vez mais "em cima do muro". O que quero dizer com isto não é que nos abstemos da opinião. Não estou falando sobre omissão. Seria uma posição central mais justa, que pesa a maioria dos aspectos e das oposições, que avalia melhor e julga menos.

terça-feira, 23 de março de 2010

Podem umas pessoas serem melhores do que as outras?

Estava lendo um texto sobre "bullying" entre adolescentes no blog da Maria Valeria e me ocorreram duas coisas. A primeira foi que a adolescência é tão complicada que mesmo que você não tenha sofrido bullying, isso não significa necessariamente que você tenha se sentido bem consigo mesmo e que não tenha carregado por algum tempo marcas difíceis de apagar. Que não tenha precisado trilhar um caminho longo e penoso em busca de sua auto-estima. Arrisco a dizer que mesmo aqueles que considerávamos populares na nossa época, eles mesmos tinham seus próprios fantasmas a enfrentar. Especialmente os que praticavam o assédio, talvez.

A segunda coisa que me ocorreu foi na parte em que o texto fala sobre como as diferenças são interessantes e necessárias. De fato, a menina ser a mais bonita da turma não a torna melhor do que o nerd que tira as melhores notas, assim como as melhores notas também não o tornam melhor. Cada qual tem qualidades ou defeitos que não os tornam necessariamente melhores ou piores. Fiquei entretanto com algo latejando no fundo da mente, apesar dessa constatação. Podem umas pessoas serem melhores do que as outras?

Ora. Não tenho dúvidas de que Gandhi foi melhor do que Hitler, por exemplo. Então o que poderia tornar uma pessoa melhor do que a outra? Cheguei a algumas conclusões. Percebi que com o medo de sermos injustos, algumas vezes afirmamos que não há uma pessoa melhor do que a outra. Para ser mais precisa eu diria que: todas as pessoas merecem as mesmas oportunidades, sejam quais forem as escolhas que tenham feito na vida. Seria algo meio espiritual ligado ao pensamento de que "se Deus perdoa e dá sempre uma nova chance, porque não haveríamos nós de perdoar também". Creio que é um ensinamento difícil de praticar mas totalmente saudável.

Como seria então uma pessoa melhor do que a outra? Eu acredito em evolução. Acredito na vontade de aprender, na utilização do conhecimento e das experiências como uma forma de se melhorar. Ora, então voltamos ao princípio. Se existe o desejo de melhorar, então automaticamente concluímos que umas pessoas podem ser melhores do que as outras, caso contrário não faria sentido querer evoluir. Como medir isto então? Porque cá entre nós, a questão pode se tornar muito subjetiva. Creio que a melhor forma de medir seja pelo bem praticado, pelo menor grau de egoísmo. A nossa liberdade termina onde começa a do outro. Então não adianta dizer: "ah, coitado, ele tem um vício mas não faz mal a ninguém, é um pobre coitado, vítima da vida". Pode até existir a boa intenção da pessoa em outros contextos. Mas a partir do momento em que a pessoa se embriaga e pega um carro, mesmo que ela seja bem intencionada, os bons atos se anulam no momento em que ela expôs a vida de outros ao perigo. Dá até para fazer uma matemática se a prova precisa ser racional. Um caderninho de débitos e créditos.

Concluindo: não existe um modelo certo para a vida, uma determinada forma de ser mais certa ou errada. Entretanto existem atos e resultados que podem colocar uma pessoa na frente da outra em termos de valor humano e contribuição para a humanidade. Mesmo que a humanidade signifique um restrito círculo familiar e de amigos. Já é difícil o suficiente.


quarta-feira, 17 de março de 2010

Sobre a medida do otimismo

É tão subjetivo saber o ponto certo entre a tentativa e a desistência. É o pensamento de Einstein contra a linha positivista da auto-ajuda. É preciso pensar positivo? Sim, sem sombra de dúvida. E trabalhar duro. Por outro lado, não adianta tentar e tentar do mesmo jeito esperando resultados diferentes.

Quem procura progredir, fazer auto-avaliações, vive constantemente preso nessa dualidade. Será que devo continuar? Será que estou indo pelo caminho certo? Ou devo admitir que esta escolha não está correta e que seria melhor buscar uma melhor alternativa? Será que estou desistindo fácil demais? Porque diariamente somos bombardeados por mensagens superficialmente positivas. E a gente acaba às vezes, até se sentindo pior, culpado, por não conseguir se manter firme na nossa decisão de pensar positivo e ter uma postura otimista diante da vida.

Por mais doloroso que isso possa parecer, é saudável. Porque coloca a nossa mente em movimento; esse exercício nos mantém vivos e dispostos a melhorar. Duro mesmo é a cegueira. É quando percebemos no outro (e tememos que isso acontece conosco também) que existe uma total ignorância a respeito das suas aptidões e limitações. Vemos que foi criado um mundo paralelo onde todas as contatações seguem um caminho irreal ou pior, quando percebemos que todas as falhas, todos os erros são transferidos para o "mundo". Família, colegas de trabalho, estranhos, todos são culpados pela ineficiência que na verdade é própria. E então, o que era otimismo vira na verdade pessimismo, e reforçado pela teimosia e pelo orgulho.

Duro isso. Fico pensando que quando temos dúvidas desse tipo, o melhor a fazer é criar referências. O número de pessoas que nos dizem a mesma coisa mesmo que a gente não queira aceitar, o tempo em que estamos insistindo na mesma atitude, os sinais que o corpo nos dá de que a nossa persistência, por mais que a gente acredite ser necessária, não está nos levando a lugar algum. Dores de cabeça, de estômago, problemas para dormir, vícios, crises de pânico, seja qual forma que o nosso corpo escolha. Ou mesmo a solidão. Algo vai mal. Pode ter certeza.

Ninguém é perfeito e não é fácil admitir nossos próprios erros. Mas insistir nos próprios erros definitivamente não é a solução. É recrudescer, definhar, até virar um ovo, sem movimento, isolado do mundo.

Se pode existir uma faceta melhor do otimismo, creio que seja a predisposição para a mudança realista. Nem que seja uma bem pequena (ou imensa, dependendo do ponto de vista) como escutar, refletir e aceitar opiniões alheias. Estar pronto para olhar para si sob a perspectiva dos outros, já que a própria não funciona. E a partir daí, enfrentar o medo da mudança, mesmo sabendo que isso também trará dificuldade e dor, porém uma dor diferente, a dor do nascimento, como a lagarta (desculpe a analogia piegas), que deixa o seu casulo.

domingo, 14 de março de 2010

Paralisia e dor

Ontem eu senti uma dor que não era minha.
A dor de estar amarrado.
De se sentir paralisado.
De chegar num ponto da vida, olhar para trás,
e não encontrar os sonhos de juventude.
De perceber que se
ao mesmo tempo existe o desejo em melhorar,
não se sabe como,
o caminho para chegar lá.

A cegueira e a paralisia provocada pela austeridade.
O preço que se paga por culpar o mundo pela sua própria miséria.
A incapacidade de mudar verdades ilusórias
geradas pela arrogância e a prepotência.
A surdez, aquela que bloqueia o ouvido e a visão.
A insensibilidade.
A falta do abraço como consequência de não saber doar.

Eu senti essa dor que não era minha.
Eu quis mostrar o caminho.
Eu percebi que é preferível a dor da mudança.
Do que a dor da paralisia.


O jovem artista

Coincidiu no outro dia de eu estar refletindo sobre o jovem artista e me deparar com a obra de Matisse do post anterior. Eu estava olhando um livro sobre designers gráficos e ao mesmo tempo em que me encantava com as produções eu pensava sobre como pode se tornar solitário ser um artista em início de carreira. Solitário e egoísta. A arte, quando exercida desde cedo e como único objetivo, mescla-se com a formação de quem realmente somos. Para nos tornarmos "boas pessoas" necessitamos ser reconhecidos, precisamos criar algo que se destaque, que seja identificado como genial, precisamos da aprovação nítida do público em geral. Se somos reconhecidos, corremos o risco de nos fecharmos em nosso próprio "eu", de criarmos um mundo que de preferência gira em torno de nós. Nos tornamos demasiado orgulhosos, vaidosos. Por isso, me tocou o texto. Me parece muito mais emocionante a arte que flui de alguém que se deu a oportunidade de viver, de aprender através das mais variadas experiências, sejam elas dolorosas ou alegres, com certeza edificantes e que por isso sentiu a necessidade de expressar de alguma forma os sentimetos que resultaram. Sem se preocupar com a repercussão da obra. Criar por prazer, por orgulho em finalizar algo único e pessoal. Transmitir sensações sem medo de ser julgado ou copiado. Ensinar, compartilhar aprendizados. Creio que aí reside uma arte verdadeira. Não a arte fabricada com a necessidade de firmar a auto-estima. A arte que flui do prazer contido no processo de criação. Beleza que transcende o visível.



segunda-feira, 8 de março de 2010

Fonte de inspiração II (de hoje)


O espírito humano
O artista deve
Colocar toda
A sua energia
Sua sinceridade
E a modéstia
A maior
Para descartar
Durante o seu
trabalho os
Velhos clichês

Matisse - Série Jazz


Taschen


Opa, e por falar em Taschen, olha que site fantástico. Amo isso.

Buscando inspiração


Eu estava folheando o Art Now Vol. 3 da Taschen e me deparei com as obras da Beatriz Milhazes. Fora o orgulho, de ver uma artista brasileira, mulher, com projeção internacional, teve aquele momento "hum! Eu gostei disso e havia me esquecido". Então para não esquecer mais, postei aqui. Dá uma boa releitura em scrapbook.