quarta-feira, 29 de abril de 2009

De novo sobre o luto

Domingo eu amanheci num enterro. Eu acordei muito cedo, após poucas horas de sono. Eu me levantei, me vesti, entrei no meu carro e peguei a estrada. Após tantos anos dirigindo, engraçado como o carro acabou se tornando o meu velho amigo. Entro nele, escolho minhas músicas preferidas e fico ali, naquele momento só meu. Eu, meu carro, música, estrada. Acaba sendo um momento prazeiroso.

Dirigi-me ao interior de São Paulo. Estrada vazia, tranquilidade, verde, curvas suaves e velocidade. Vou rezar para não ter passado por nenhum radar.

Entrei na cidadezinha adormecida. Poucos carros na rua, quase ninguém andando pelas ruas. Segui o caminho que o meu instinto mandou. No centro, característico das cidades de interior, uma dúvida. Utilizei a técnica de sempre. Perguntar a um transeunte que portava a característica de uma pessoa que mora no interior. Tranquilidade, presteza, gentileza. Após as tranquilas mas precisas instruções, cheguei ao meu destino.

Após estacionar o carro em frente ao cemitério, de novo dúvida. Dei "bom dia" para o jornaleiro, perguntei pelo velório e ele me apontou o local. Fui caminhando apressada pois já era quase hora da saída do cortejo. Rapidamente encontrei a sala correta. No meio da cantoria e do choro, consegui avistar minha amiga. Eu a vi e as lágrimas escorreram. A imagem de força com a qual estou acostumada, fragilizada pela dor. Chorei por ela e por mim. Eu me permiti chorar tudo o que não havia chorado no enterro do meu pai. Despida do orgulho, da responsabilidade, simplesmente fiquei ali, inerte, chorando ao som dos cânticos, observando as pessoas, tentando apreender os sentimentos de cada um presente.

Segui o cortejo até o local do sepultamento. Mais lágrimas. Sofridas.

Eu me comuniquei por e-mail com a minha amiga. Falamos sobre as perdas, sobre as providências a serem tomadas após a morte. Sobre mexer nos pertences das pessoas, destiná-las a doação, coisas do tipo.

Ela me contou sobre os momentos que antecederam a morte.

Fiquei pensando sobre isso. Sobre as mortes de pessoas queridas que eu precisei enfrentar até hoje. No fim acabei refletindo sobre algo que ela concordou comigo. Falei sobre o quanto é importante vivenciarmos estes últimos momentos. É algo de extrema dor mas que carrega em si algo de beleza. Eu jamais esquecerei da forma como a minha avó se despediu de mim antes de morrer. Jamais esquecerei da oportunidade de carinho que pude desfrutar com meu pai nos seus últimos momentos de vida. O quanto que o sofrimento provocou a nossa aproximação, experiências que nos melhores momentos de nossas vidas não fomos capazes de partilhar.

Fico então com a sensação, mais uma vez, de que mesmo na dor há uma beleza implícita. Recebemos a oportunidade de nos despir das vergonhas, das mágoas, dos traumas e de praticar a pura emoção, do amor incondicional. De aproveitar um momento único que jamais irá se repetir em nossas vidas. E que por isso, jamais será esquecido.

5 comentários:

Felipe disse...

No fim, somos todos iguais...

Beth Blue disse...

Que triste, eu não tive tempo de me despedir da minha mãe...Mas a vida é assim mesmo.

Barbara disse...

Também já vivi a perda de alguém querido. Quando perdi a minha tia foi muito muito muito difícil. Ela era quase uma mãe. Quando criança, a primeira palavra pronunciada foi tia e não mãe. E esse carinho e amor perdura até hoje. Às vezes ainda sou tomada de uma profunda tristeza... e choro. Não há o que fazer com esse buraco no peito. Aprendemos a conviver. E é por isso que acho que esse processo é sem dúvida alguma mais penoso para nós que ficamos. Claro que no caso da morte por doença, aquele que adoece vive o medo de morrer e vive também uma dor profunda. Mas chega o silêncio. E o corpo não é mais habitado. E aquele que fica sofre com a separação, com a perda. E cada um de nós acha a seu modo um jeito de amenizar essa dor. O tempo não apaga a lembrança mas com certeza ajuda a diminuir essa dor.

Anônimo disse...

SÓ A MORTE NOS MOSTRA O QUANTO AQUELA PESSOA NOS FOI IMPORTANTE NAS NOSSAS VIDAS
JÁ PERDI MEUS PAIS E RECENTEMENTE FOI O MARIDO
DEPOIS DA DOR ,VEM A MATURIDADE
FICAM SÓ AS BOAS LEMBRANÇAS
AINDA BEM !

Lilly disse...

É verdade... aprendendo através do sofrimento...